COLUNA ÉTICA ANIMAL - JUS ANIMALIS
15 DE MAIO DE 2024
Diminuir a velocidade pode ser um ato de amor

As atividades do Maio Amarelo são fundamentais para a conscientização sobre a segurança no volante. A iniciativa promove uma campanha global com vistas a reduzir o número de acidentes nas estradas e no trânsito urbano. Os animais atravessam as vias com ingenuidade e, por isso, são alvos fáceis de pessoas que dirigem sem os devidos cuidados e acima da velocidade permitida. Quantas pessoas param para um animal atravessar? Quantas pessoas socorrem um animal atropelado? São dados invisibilizados e que começam a ser questionados graças às campanhas de conscientização.

Não deveríamos naturalizar a presença de corpos de animais dilacerados nas ruas e nas estradas. Toda vida importa e, portanto, deve ser tratada com o máximo respeito e consideração. Se passamos por um animal morto e isso não nos afeta, corremos o risco de perder a sensibilidade para o sofrimento alheio. A atitude correta é verificar se há uma possibilidade de salvamento. 

Quando já não há vida, então, deveríamos nos preocupar em retirar o corpo da via e registrar a ocorrência nos canais responsáveis, tais como IBAMA ou ONGs. Quantas pessoas passam para um animal morto e param para colocar seu corpo em um local seguro? Como é possível as pessoas considerarem “normal” um rastro de sangue na estrada?

Em matéria sobre o Maio Amarelo, o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal considera que as políticas públicas e as ações educativas são fundamentais para sensibilizar a população para este problema. A fauna silvestre em contato com as estradas demanda uma abordagem multifacetada, que deve agregar criação de infraestrutura, ações educativas e de conscientização. Já existem modelos de corredores ecológicos em rodovias de diversos países que são criados para evitar os atropelamentos de animais silvestres. Para que estes exemplos cheguem até o Brasil é necessário um esforço do poder público e a pressão da sociedade civil [1].  

Em uma matéria para a BBC Brasil, Giulia Granchi apresenta dados alarmantes. Segundo informa a matéria, em três anos de monitoramento foram registrados 6.650 animais silvestres mortos, uma média de 180 por mês, na BR-262 no Mato Grosso do Sul. As pessoas envolvidas na pesquisa acreditam que o número deve ser muito maior, pois, os corpos de alguns animais são comidos por outros bichos, jogados na mata ou mesmo dilacerados após vários atropelamentos [2].

Houve um protesto organizado por ativistas do SOS Pantanal, os corpos de oito animais silvestres mortos foram estendidos sobre uma lona onde estava escrito: “E agora? Vocês nos veem?”. A lona ficou estendida em frente ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes. A BR-262 é conhecida como “estrada da morte” para a fauna do Pantanal e do Cerrado. A falta de medidas de segurança corrobora para o agravamento da situação.

As pesquisas sobre animais silvestres atropelados indicam que cerca de 475 milhões de animais silvestres morrem por atropelamento todo ano no Brasil. São, aproximadamente, 1.300.000 atropelamentos todos os dias. Dados que poderiam ser evitados se houvesse um trabalho mais enfático na prevenção e na responsabilização dos envolvidos [3].

Algumas medidas de segurança são simples: dirigir com atenção e respeito aos limites de velocidade, não provocar incêndios, apoiar instituições que trabalham pela preservação da fauna e compartilhar informações. Com práticas propositivas e educativas os dados poderiam mudar e salvarmos vidas.

O pesquisador Pedro Enrique Navas realizou um estudo de doutorado cuja hipótese era de que os animais doentes seriam mais suscetíveis aos acidentes. Ao realizar a necropsia de corpos de mamíferos selvagens mortos por atropelamento nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná e Santa Catarina ele constatou que a grande maioria não estava doente. Ele informou que “quanto mais invadimos as áreas das florestas, mais temos contato com os animais selvagens. Por isso, investigar cadáveres de animais atropelados é uma excepcional forma de obter amostras e entender o impacto da antropização (ação humana)” [4].

Pouco se fala sobre os animais em áreas urbanas. Os dados seriam catastróficos. Estamos à beira do abismo, vivemos cotidianamente sob o risco das mudanças climáticas e mesmo assim não vemos alteração efetiva no comportamento humano com relação a consideração da vida planetária e das demais espécies.  

Em locais onde houve uma alteração ou adequação garantindo um mínimo de segurança para a fauna o resultado foi surpreendente: “segundo os pesquisadores, nas rodovias que o estudo acompanhou e que implementaram algum dos tipos de proteção, a taxa de mortalidade por atropelamento de animais caiu cerca de 80%” [4].

Os animais não humanos podem nos trazer muitas alegrias, nos curar e nos tornar melhores, redesenhando nossa existência e nossas formas de relacionamento se estiverem vivos e saudáveis ao nosso lado, em nossos lares e nos espaços públicos construídos com base no respeito ao direito à vida, ao invés de serem torturados, mutilados e descartados. Diminuir a velocidade pode ser um ato de amor. Toda vida importa!

Referências bibliográficas

[1] NADAL, Thayara. O papel do maio amarelo na preservação da fauna silvestre. Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal. 10 mai. 2024. Disponível em: https://forumanimal.org/site/2024/05/10/o-papel-do-maio-amarelo-na-preservacao-da-fauna-silvestres/.

[2] GRANCHI, Giulia. A rodovia que mata mais de 2 mil animais silvestres por ano. BBC News Brasil. 23 mai. 2023. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cxxy6jgpj6go.

[3] INSTITUTO TAMANDUÁ. Silvestre atropelado: o que fazer? Mai. 2024. Disponível em: https://www.tamandua.org/silvestre-atropelado-o-que-fazer/. 

[4] CUSTÓDIO, Júlia. Atropelamentos de mamíferos em rodovias matam animais saudáveis da fauna brasileira. Jornal da USP. 16 abr. 2024. Disponível em:  https://jornal.usp.br/ciencias/atropelamentos-em-rodovias-matam-animais-saudaveis-da-fauna-brasileira/

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